Em 2001, fui convidada pelo Psiquiatra Dr. Marcelo T. Bartz a fazer um trabalho de arteterapia dentro do hospital da Penitenciaria do Estado de São Paulo, Carandiru, com os prisioneiros com o vírus da AIDS.
Foi uma experiência fantástica, primeiro tive que trabalhar e rever meus preconceitos perante os presidiários e em relação a doença. Foi um trabalho de grande reflexão onde pude enxergar a vida nua e crua diante dos meus olhos e perceber que por de trás de tudo isso, existe um mundo complexo onde o que é certo e errado, o que é justo e injusto , está muito além de nossas pequenas certezas e verdades.
O ateliê era de pintura em tela com gouche, começamos com tela pequenas e no final de um ano as telas eram grandes, 1x1m.
Foi experimentado a liberdade através da pintura que eles passaram a aproveitar os encontros e refletir sobre ela.
A partir do momento que eles passaram a dar de presentes as telas pintadas para seus entes queridos, puderam mostrar que eles também podem falar das flores, do céu azul, do amor e do carinho, isto foi o ápice do deslumbre que pude vivenciar.
Imagina uma criança de cinco anos de rua com pais dependentes químicos , que teve que pegar numa arma e roubar, essa criança não teve a oportunidade de pegar num pincel e se mergulhar nas cores e nem colocar num papel suas dores , medos e violências que viveu, ela infelizmente , não soube o que é uma família estruturada, nem, o que é amor ou carinho, muito menos o que é certo ou errado, nem o que é respeito...
Ver um adulto marginal dizer com seus olhos já cansados brilhar com alegria de ter pintado uma tela, e que ele tinha feito isto, foi incrivelmente recompensador, ele verbalizou que depois que iria sair da prisão ele iria vender suas telas na Praça da Republica, ele não pensava na vingança, e nem pensava na continuidade de sua vida anterior, ele sonhava em uma nova vida , sem crime...
Quando as telas da exposição foram mostradas pra um certo publico que acreditava na pena de morte, um deles olhou as telas e depois de uns minutos em silencio me disse, agora eu acredito que eles podem se regenerar... As telas era lindas, cheias de vida e cor...
Para mim, o trabalho atingiu seu objetivo de curar e transformar um Ser que estava pra lá do abismo social..
No final de um ano foi feita uma exposição " O outro lado do Ser marginal" dos seus trabalhos junto com seus parentes e amigos onde puderam mostrar sua alegria e satisfação de realizarem um trabalho de paz,harmonia, alegria e muitas cores , eles fizeram arte!
Eles fizeram isso!!! Com surpresa e admiração seus parentes exclamavam.
Fazer arte para eles foi algo novo, especial, uma nova oportunidade que eles nunca tiveram acesso, puderam experimentar e ampliar suas sensibilidades, de sentir gente, tiveram prazer, satisfação, reconhecimento, aumentando a autoestima, desencadeando um processo de fortalecimento a imunidade, ajudando no restabelecimento da saúde.
A arte pôde trazer qualidade de vida e diminuição das dores.
No ano seguinte o Carandiru foi implodido.
Um comentário:
Bom passar por aqui!!! Se me permiti voltarei.
Meu carinho e respeito desejando sucesso sempre!!!
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